domingo, 1 de julho de 2018

Diante da Lei.


Diante da lei está um porteiro. Um homem do campo chega a esse porteiro e pede para entrar na lei. Mas o porteiro diz que agora não pode permitir-lhe a entrada. O homem do campo reflete e depois pergunta se então pode entrar mais tarde.

- É possível – diz o porteiro. Mas agora não.

Uma vez que a porta da lei continua como sempre aberta e o porteiro se põe de lado, o homem se inclina para olhar o interior através da porta. Quando nota isso, o porteiro ri e diz:

- Se o atrai tanto, tente entrar apesar da minha proibição. Mas veja bem: eu sou poderoso. 

E sou apenas o último dos porteiros. De sala para sala, porém existem porteiros CAD um mais poderoso que o outro. Nem mesmo eu posso suportar a simples visão do terceiro.

O homem do campo não esperava tais dificuldades; a lei deve ser acessível a todos e a qualquer hora, pensa ele; agora no entanto, ao examinar mais de perto o porteiro, com seu casaco de pele, o grande nariz pontudo, a longa barba tártara rala e preta, ele decide que é melhor aguardar até receber a permissão da entrada. (KAFKA. Franz. Um médico rural. O guardião da lei. Trad. Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras, 1999, p.27)

Muitos são os que batem à porta da lei e nela encontram um impeditivo para acessá-la. 

Muitos são os que buscam na lei a solução de problemas sociais, educacionais e de comportamento. Muitos são os que buscam o respeito humano na lei.

Muitos são os que encontram um porteiro irredutível e caprichoso que os impedem de se colocar diante da lei. Enfim, nem todos são os homens do campo, contudo, todos que são impedidos estão assentados na inocência do homem do campo que apenas aceita um não e aguarda. Observando o seu cerceador.

Muitas vezes os impeditivos surgem por força da informação deformada, a informação sem clareza, a falta de paciência ou até de boa vontade para explicar os procedimentos e regulamentos que antecedem o acesso à lei.

Muitos devem estar pensando que estamos numa época que um simples clique pode trazer toda a lei desejada, que o acesso é garantido, mas quem disse que ler o teor da lei é ter acesso?

Muito mais amplo é o acesso, e nem sempre o fato de mover uma ação corresponde ao acesso desejado, e um fato econômico aqui é predominante.

Muitas vezes encontramos ações movidas e processos mal conduzidos em que o contraditório é esquecido e o devido processo legal esfacelado.

E, assim, permanece-se sentado à porta esperando que seja admitido perante a lei.




Olinda Caetano Garcia
advogada e coach

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